I.
Há uma lâmpada em Livermore, nos EUA, que está acesa há mais de 120 anos. Com algumas raríssimas exceções, como picos de energia e duas rápidas mudanças, a lâmpada nunca foi apagada. E nunca queimou.
Todas as demais lâmpadas do mundo não viveram nem viverão sequer um décimo do tempo que já viveu a lâmpada centenária (apelido que recebeu).
Um documentário, certa vez, sugeriu uma conspiração em 1929, na qual fabricantes de lâmpadas se reuniram para estipular uma vida útil aproximada de seus produtos, de modo que não durassem muito e obrigassem as pessoas a comprar novas lâmpadas.
Hoje, vendo tudo o que compramos, perdemos e compramos de novo, não é difícil acreditar nesse tipo de conspiração. Já parou para pensar que, tecnicamente, você aluga seu telefone celular? Seja porque quebrou, foi roubado, parou de funcionar, ficou lento ou deixou de ser atualizado, você continua sempre comprando um novo celular. Algumas empresas já foram até multadas quando se constatou que seus softwares faziam os modelos mais antigos ficarem lentos, problemáticos e ineficientes após poucos anos, obrigando o usuário a comprar um novo modelo.
Mas tudo o que temos acaba sendo trocado também por se tornar obsoleto ou porque algo mais eficiente e econômico foi finalmente inventado. A grande maioria não esperou suas lâmpadas antigas queimarem para trocá-las por lâmpadas de LED, que têm um consumo de energia muito menor e uma durabilidade muito maior.
Tudo acaba, de alguma forma, tornando-se obsoleto e sendo substituído ou, simplesmente, descartado.
Quase tudo.
II.
Comprei um carro zero-quilômetro há poucos meses. É a primeira vez que compro um carro novo. Passei a dirigir com um cuidado e uma responsabilidade extras. Tudo com medo de macular aquele carro que eu ainda dirigia em “lua de mel”.
Há alguns dias, uma motorista, em um momento de distração, não me viu parado no sinal vermelho e, sem sequer frear, acertou em cheio a traseira do meu carro, amassando-o por fora e causando grandes estragos internamente. Num instante, perdi aquele carro novo. A oficina vai consertar, trocar peças e deixá-lo “como novo”, mas não será mais um carro novo, será um carro consertado. E certamente não sairá 100%, pois conhecemos a mão de obra brasileira.
Sentado no sofá naquela noite, peguei o livro da vez para me distrair daquela sensação ruim.
Veio-me, então, um pensamento interessante: só não nos preocupamos em manter aquilo que não podemos perder.
Num primeiro momento, você pode aplicar essa reflexão a relacionamentos, mas há algo muito mais importante que não podemos perder — e não nos preocupamos em manter: o conhecimento.
O conhecimento vem do estudo, da leitura, da experiência. Coisas algumas vezes caras, mas que são eternas e nos influenciarão em todos os aspectos de nossa vida. E muitas vezes, por serem caras, trabalhosas ou por exigirem uma ginástica mental, não investimos nelas.
Investimos dinheiro, trabalho e esforço para comprar um carro que pode ser destruído num piscar de olhos, num jantar que será transformado em fezes, num casamento que não dará em nada, em smartphones que se tornarão obsoletos. Tudo isso é passageiro. O conhecimento, não. Ele fica, enriquece, desenvolve e floresce nossa visão única de mundo.
Dizem que um filósofo lê muitos livros em um ano, e um homem-bomba fundamentalista leu apenas um livro por muitos anos.
A leitura sempre foi e sempre será o mais fácil canalizador de conhecimento, cultura e descobrimento. Ao ler, estamos entrando na mente de poetas, pensadores, gênios e loucos — muitos que já partiram desta existência há muito tempo, outros que ainda estão compartilhando tudo o que acumularam e viveram.
Seguro total deveria ser obrigatório para se ter um carro. A leitura devia ser pré-requisito para a vida em sociedade.
Leia.
E estamos começando mais uma temporada da Sociedade Literária, o clube de leitura do Escriba Cafe. Conheça pessoas interessantes e livros incríveis.